domingo, 18 de abril de 2010

Maia Magnético

O nome já traduz um pouco a proposta. Mundialmente anônimo – O Magnético Sangramento da Existência(2010). Mimetismo e viagens, mixagem e experimentação. Ele já está acostumado a isso e cria seu som efusivo a partir de explosivas e suingadas referências. Hip hop, dub, Jorge Ben, Chico Science e Nação Zumbi, quase tudo música de negro. Da melhor e mais inspirada. Lúcio Maia, o guitarrista virtuoso do Nação, homem por trás do projeto Maquinado acaba de parir um novo disco, o segundo, depois de O Homem Binário (2007). O título é aquele viajandão lá de cima e o resultado, bem... quem tem ouvidos que escute. E se não há surpresas, há encantamento e uma coerência monstruosa.

Quem conhece Lúcio Maia, cabeça pensante e ativa do seminal Nação Zumbi, e do seu primeiro projeto solo, sabe que o cara é impulsivo e irrequieto. Se em O Homem Binário, ele desenvolveu potência criativa, mixando suas referências musicais em um disco mais cartesiano, na obra solo seguinte, radicalizou. Está mais experimental e cosmopolita. Daí, talvez, o mundialmente anônimo que aparece na capa do CD. É anônimo porque junto cacos da música global, cacos de sonoridades que fizeram e fazem sua cabeça. É também anônimo porque transparece o sentimento do mundo, a revolta com o caos ético, a violência e com o desrespeito acelerado ao planeta, nas linhas e entrelinhas das letras. Ideologia, Maia quer uma para viver. E ele reivindica isso num disco orgânico e difícil.

Não vai ser de cara que você vai gostar de Mundialmente Anônimo. Já na primeira faixa, Lúcio Maia demonstra que não vai oferecer feijão com arroz, nem que está muito disposto a fazer algo mais palatável. "Zumbi", de Jorge Ben, ganha uma versão torta, incandescente. Uma citação a Clara Crocodilo, personagem criado por Arrigo barnabé e que redundou num dos discos brasileiros mais conceituais e revolucionários da década de 80 do século passado, abre a sonzeira. Moderno e roqueiro, Maia se ampara em sua guitarra virulenta para dar peso a um dos clássicos de Jorge. A percussão e a bateria eletrônica, também densas, juntam-se ao carnaval cibernético proposto pelo pernambucano.

A carga sonora sem fronteiras produzida em "Zumbi" estão presentes também na discursiva “Provando a Sanidade”, com percussão e guitarra, sempre precisas, no talo. Ao fundo, Maia destila suas impressões sobre o mundo e sobre o homem, pobre de nós, no meio do tiroteio provocado pela nova ordem econômica. A tradução do louco mundo de hoje é feita também, dessa vez sem palavras, na interessante e emblemática "SP". Entre vociferações vocais inaudíveis e a palavra São Paulo, modificada por computadores, o músico descarrega barulhos de sirenes, de buzinas numa profusão experimental que mistura samba, hip hop e outros ritmos. A guitarra mais nervosa que nunca se sobressai nesse instrumental de primeira.

Tirando o pé do acelerador, Lúcio Maia, oferece ainda ao ouvinte, como pausa necessária, um som, digamos, mais normal. Na versão, longe da fidelidade, de "Super Homem Plus", do parceiro de mangue beat Mundo Livre S.A, o músico cadencia tambores, metais e guitarras, para dar uma sensualidade inesperada a uma das melhores e mais ácida música criada por Fred 04. A mediana “Girando ao Sol” e a instrumental “Recado ao Pio, extensivo ao Lucas”, reverbs e guitarras languidas são bases para viagens hipnóticas. O toque latino, com cordas que lembram o grande Carlos Santana, da pop “Pode Dormir”, e o rap chatinho “Tropeços Tropicais”, cantada por Lurdes da Luz, do Mamelo Sound System, destoam um pouco do projeto como um todo. Mas, aí, você já está rendido a arte maior de Maia, esses grande arquiteto da música moderna. Mestre da fusão rítmica, esse carinha fez de Mundialmente Anônimo, um disco de responsa.

Cotação: 4

Vá de Maquinado:

http://www.mediafire.com/?nm3jynm2jhn

Ouça "Zumbi":

E também "Super Homem Plus":

Assista “Pode Dormir”: