sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Som movediço

Sabe quando uma música te leva para territórios inesperados, provocando sensações diversas e contrárias em rápidos minutos? Pequenos choques térmicos. Um som orgânico, movediço, que te tira o norte exatamente naquele momento em que você se imagina senhor da situação. Senti isso quando ouvi Veckatimest, terceiro álbuns dos irrequietos novaiorquinos do Grizzly Bear, e um dos mais elogiados discos do ano de 2009 pela crítica especializada. Não conhecia a banda - só depois me interessei em ouvir a discografia completa - e também não me surpreendi com sua proposta sonora ousada e complexa, ainda mais porque a turma vem do Brooklyn, onde tem sido saído algumas das bandas mais inventivas dos EUA, vide The National e TV on The Radio.

Essa galera do Brooklyn gosta mesmo de inventar. Ou, pelo menos, sair do lugar comum. Grizzly Bear vem desde o primeiro disco, Horn of Plenty(2004) – o segundo é o bacana Yellow House(2006) – buscando uma sonoridade onde se mistura influências dos anos 60 e 70, bebendo fartamente do psicodelismo e do folk, e do tempo presente, com seu dream pop e lo-fi, gêneros do rock cabeção de décadas distintas que se casam, porém, perfeitamente. Muitas bandas atuais tentam essa fusão. Mas, o grupo em questão simplesmente tentou levá-la a exaustão, com um preciosismo e talento que fazem de Veckatimest uma obra robusta, madura, que se resolve muito bem – a partir da viagem que se propõe – em si mesma.

A sonoridade dos 60 e 70 está na pegada folk e psicodélica, com seus instrumental vigoroso, catártico e com arranjos vocais trabalhados. Isso é claramente palpável na ótima “While you wait for the Others”, na qual a guitarra rascante e distorcida, típica dos dois últimos decênios, comungam com um corinho suave e bem orquestrado dos quatro músicos da banda, sem se atropelarem. Nas entrelinhas, o experimentalismo está presente na atonalidade dos instrumentos, como pode ser ouvido também na complexa “I Live with You”, onde um arranjo camerístico de cordas dialoga mais tarde com guitarra, baixo e baterias barulhentos, numa música triste, barroca e de melodia forte.

Os contrapontos marcantes de boa parte das composições, as mudanças de andamento constantes, suavidade e distorções, são usadas abundantemente. O que pega o ouvinte de surpresa. E atordoa. É o que acontece, por exemplo, com “Southern Point”, que abre espetacularmente o álbum, com seu jeitão sessentista, com direito a pandeirinho e coral forte. O instrumental redentor e um arranjo complexo fazem dessa uma das melhores composições do CD. O susto passa com “Two Weeks”, música seguinte, que mostra um lado mais pop e pé no chão do Grizzly Bear. O dream pop do grupo aparece intenso na linda “All we Ask”, melancólica e envolvente, que se aproveita de uma percussão e baixo forte para abrir caminho para a voz limpa de Daniel Rossen (guitarra, teclado) em parceria com os gogós de Ed Droste (guitarra, teclado), Chris Taylor (baixo, voz, sopro e eletrônicos) e Christopher Bear (bateria, voz).

“All we Ask” é emblemática do som feito pelo Grizzly Bear. É como se avistássemos à frente uma névoa, uma densa camada sonora na qual somos convidados a adentrar, sem medo. Só assim poderemos sentir a musica, desvendar a complexidade do som proposto, as minúcias musicais dos arranjos bem trabalhados. Barulho e silêncio, som sinuoso, corajoso, difícil de ouvir. A experiência, contudo, é válida. Só assim mesmo para viajar na beleza e estranheza de composições como “Dory” e “Foreground” ou na tensão permanente de “Read, Able”. Enfim, um disco profundo, que precisa ser ouvido várias vezes para que você possa criar intimidade. Quer um conselho? Deixe-se enredar nessa instigante trama sonora.

P.S.: Novidade na área. Lá embaixo você vai poder ouvir todo o Veckatimest, faixa a faixa, pelo Soundcloud. Divirta-se.

Cotação: 5

Tente um:

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Ou tente o outro:

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Veja o clipe de “Two Weeks”: