terça-feira, 19 de maio de 2009

Meio Chico meio Carvalho

O diretor Walter Carvalho sabia que tinha um trabalho hercúleo pela frente quando resolveu filmar Budapeste, de Chico Buarque. Afinal, o livro sobre um escritor em crise existencial com a profissão e relacionamentos amorosos, com sua narrativa entrecortada, não facilitava uma tradução para as telas. Em Budapeste, o filme, que estreia nesta sexta-feira, 22 de maio, nos cinemas, o cineasta respeita Chico, mas amplia o lastro subjetivo da obra literária buscando uma co-assinatura para a história.

O filme mergulha junto com o narrador, o ghost-writer José Costa, nas amplas possibilidades de reinvenção que o amor, o verbo e uma língua propiciam. O personagem empresta seu talento descomunal às pessoas que tentam a fama ou querem contar suas histórias em um livro. Ele próprio tem medo de expôr sua criatividade. Essa crise é bem resolvida no filme de Carvalho, que valoriza nas imagens o poder da palavra escrita, que domina e escraviza Costa, vivido magistralmente por Leonardo Medeiros.

O espectador não deve buscar no longa-metragem a similitude com o livro. Até porque a subjetividade deste não permite. A linha básica do romance é respeitada. Maior do que seus personagens, porém, é exatamente essa relação dual de Costa com a língua e de que forma ela molda comportamentos, cultura e alimenta paixões. É o verbo, mesmo em outra língua, a húngara, que faz o personagem se encontrar. E é essa vida desfeita e refeita pela palavra que vale a pena acompanhar no filme de Carvalho, na foto acima com o presidente Lula.

Budapeste não é um grande filme, assim como o livro de Chico também não é lá essas coisas. A narrativa monolítica cansa um pouco, mas há iluminuras que compensam, como a linda fotografia amarelecida da Budapest, a presença de Chico Buarque numa ponta bem humorada e as interpretações, a já citada de Medeiros, e da atriz húngara Gabriella Hámori. O resto é viagem. Você só precisa estar disposto a embarcar nela.